Racismo no esporte

Notícia de jornal

O Globo, 26 de agosto de 2017, Seção Esportes.

A ofensa de um torcedor do Botafogo à família de Vinícius Júnior, do Flamengo, há dez dias, é o item mais recente de uma lista que, em 2017, atingirá um tamanho sem precedentes. O prognóstico é do Observatório da Discriminação Racial no Futebol, que desde 2014 mapeia casos de racismo relacionados a profissionais do esporte brasileiro — o que exclui o caso do torcedor rubro-negro que ofendeu um segurança no Maracanã. Já são mais de 40 episódios catalogados até agora, número bem superior aos 25 verificados ao longo do ano passado.

O esforço de reunir essas informações em um site (observatorioracialfutebol.com.br) é dos administradores Marcelo Carvalho e Débora Silveira. O Observatório surgiu em 2014, quando uma série de episódios racistas tornaram vítimas o ex-árbitro Márcio Chagas, o ex-jogador Tinga, que defendia o Cruzeiro, e o volante Arouca, ex-Santos e hoje no Palmeiras. Em menos de um mês, os três foram ofendidos durante ou depois de partidas dos campeonatos estaduais ou da Libertadores.

Incomodado com a dificuldade para encontrar informações sobre o desenrolar desses casos, Marcelo iniciou um trabalho de monitoramento. Atualmente, dedica-se de forma quase integral ao projeto, que é mantido com a ajuda de parceiros e através da venda de camisas e canecas personalizadas no site.

O gaúcho parte dos relatos na imprensa para construir um mosaico. Em 2014, mapeou 20 ocorrências. Esse número subiu para 35 no ano seguinte, recuou para 25 em 2016, antes de explodir em 2017. O fundador do Observatório enxerga três fatores como fundamentais para o pico atingido este ano: o espaço que o tema tem recebido na mídia, o posicionamento mais contundente dos atletas e um momento de intolerância no país.

Se a identificação se tornou mais eficiente, punir ainda é um problema. Dos 20 casos levantados em 2014, apenas seis terminaram em algum tipo de sanção aos envolvidos. Para Marcelo, o principal entrave é o artigo 243-G do Código de Justiça Desportiva Brasileira, que orienta o julgamento de casos de racismo no futebol:

— Não há lógica. O artigo fala em punição, mas não explica como fazer. Ela varia de acordo com a cabeça dos julgadores.

O organizador do Observatório vê complacência dos tribunais desportivos, que, por estarem inseridos na estrutura do futebol, não teriam interesse em punir seus filiados. Também enxerga fragilidades na Justiça comum, que, ao enquadrar casos direcionados a um indivíduo como injúria racial — e não racismo —, permite que sejam feitos acordos.

DISCUSSÃO RESTRITA

No caso mais emblemático de sanção a um clube, o Grêmio foi excluído da Copa do Brasil de 2014 por decisão do Superior Tribunal de Justiça Desportiva (STJD). A punição foi uma resposta às ofensas racistas praticadas por um grupo de torcedores contra o goleiro Aranha, do Santos. Já no episódio envolvendo a família de Vinícius Júnior, apenas um indivíduo, André Luís Moreira dos Santos, foi flagrado em gestos racistas. Por isso, o STJD descartou enquadrar o Botafogo no artigo 243-G. Ao torcedor foram aplicadas medidas restritivas, como a necessidade de se apresentar à polícia em dias de jogo do alvinegro por seis meses.

Marcelo acredita que a discussão sobre racismo está restrita “a uma bolha que cresce na borda do futebol, longe das pessoas que tomam decisões nos clubes”. As agremiações são, na visão dele, coniventes por não se preocuparem em fazer campanhas de conscientização e prevenção:

— Os clubes precisam cumprir um papel social, mas nenhum deles toma ações preventivas. Existe o cuidado de alertar o torcedor sobre o risco de atirar objetos em campo. Por que isso não acontece com o racismo?

Anualmente, o Observatório produz um relatório dos casos mapeados. Na última edição, incluiu episódios de xenofobia e homofobia nos estádios. Foi mais uma iniciativa em busca de algo que anda em falta: tolerância à diversidade.

Leia mais: https://oglobo.globo.com/esportes/numero-de-casos-de-racismo-bate-recorde-mas-punicoes-sao-raras-21750623#ixzz4qyxpK6wX

 

 

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