Necropolítica, Achille Mbembe

Acabei de ler “Necropolítica”, um livrinho de 70 páginas de Achille Mbembe, professor camaronense de História e de Ciências Políticas.

Impressionante! Qualquer semelhança com o que estamos vivendo no governo de Witzel, no Rio de Janeiro, não é mera coincidência.

Vou transcrever uns trechos:

“Sob condições de soberania vertical e ocupação colonial fragmentada, comunidades são separadas segundo um eixo de ordenadas. Isso conduz a uma proliferação dos Estados de violência. Os campos de batalha não estão localizados exclusivamente na superfície da terra. Assim como o espaço aéreo, o subsolo também é transformado em zona de conflito. Não há continuidade entre a terra e o céu. Até mesmo os limites no espaço aéreo dividem-se entre as camadas inferiores e superiores. Em todo lugar, o simbolismo do topo (quem se encontra no topo) é reiterado. A ocupação dos céus adquire, portanto, uma importância crucial, já que a maior parte do policiamento é feito a partir do ar. Várias outras tecnologias são mobilizadas para esse efeito: sensores a bordo de veículos aéreos não tripulados, jatos de reconhecimento aéreo, prevenção usando aviões com sistema de alerta avançado, helicópteros de assalto, um satélite de observação da Terra, técnicas de holografia. Matar se torna um assunto de alta precisão.” (p. 46-47)

Enquanto o helicóptero de combate Apache é usado para patrulhar o ar e matar a partir dos céus, infrator blindado ‘bulldozer’ (Caterpillar D-9) é usado em terra como arma de guerra e intimidação. Em contraste com a ocupação colonial moderna, essas duas armas estabelecem a superioridade de instrumentos de alta tecnologia do terror da era contemporânea. (…) Populações inteiras são o alvo só soberano. As vilas cidades situadas são cercadas e isoladas do mundo. A vida cotidiana é militarizada. É outorgada liberdade aos comandantes militares locais para usar seus próprios critérios sobre quando e em quem atirar. (…) Instituições civis locais são sistematicamente destruídas. (…) Às execuções a céu aberto somam-se matanças invisíveis.” (p. 48-49)

Segundo dados apresentados pela jornalista Flávia Oliveira, “desde fevereiro de 2018, quando foi decretada a intervenção federal, o Instituto de Segurança Pública contabilizou 8.758 homicídios no Estado do Rio de Janeiro; a polícia matou 2.624 pessoas, das quais 1.249 nos oito primeiros meses do governo de Wilson Witzel”. (O Globo, 27/09/2019)

Em outro artigo, Flávia Oliveira diz que “os números também confirmam a escalada da violência pela multiplicação dos confrontos. De janeiro a julho, houve 1.075 homicídios decorrentes de intervenções policiais no estado, informou o Instituto de Segurança Pública (ISP). Foi recorde histórico. Até agosto, a Rede de Observatórios da Segurança contou 1.697 operações com trocas de tiros“. E cita Thula Pires, professora de Direito Constitucional da PUC-Rio, que afirma que “a partir das violências perpetradas no Rio, podemos enxergar uma política racista de extermínio e instrumentalização da vida, mobilizada pelo aparato estatal que impõe à população negra a morte e reforça a ideia de que a possibilidade de vida plena é atributo exclusivo da branquitude. A necropolítica não foi inventada no governo Witzel, mas tem na atual gestão uma exacerbação que não pode ser negligenciada ou simplificada”. (O Globo, 20/09/2019)

Há muito sangue ao nosso redor… Sangue de muita gente inocente. A maioria preta e parda.

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