Mais evidências sobre o bônus

Novo estudo mostra ganhos na aprendizagem dos alunos, mas restrito aos primeiros anos da política

Por Antonio Gois, jornal O Globo, 11 de setembro de 2017

A eficácia do pagamento de bônus salariais aos professores atrelados à melhoria do aprendizado de alunos é um dos tópicos mais controversos no debate educacional. A ideia de premiar os melhores trabalhadores de acordo com o seu mérito parece simples e justa. Na educação, porém, sua implementação tem se mostrado bastante complexa. Nos EUA, país que mais adota a prática, o volume de estudos aponta em geral para efeitos nulos ou inconclusivos.

Uma das razões para isso é que os resultados do trabalho de um professor ou de uma escola sofrem muito mais influências de fatores externos, e, por essa e outras razões, são mais difíceis de mensurar do que, por exemplo, o volume de vendas ao fim do mês de cada funcionário de uma loja de sapatos. E, se na loja de sapatos o bônus só faz sentido se ao final resultar num aumento de vendas, na educação, o que importa é saber se os alunos estão se beneficiando da política, tendo melhores resultados de aprendizagem. Parece uma afirmação óbvia, mas é frequentemente esquecida no meio do tiroteio ideológico entre defensores e críticos da medida.

No Brasil, o mais recente trabalho acadêmico sobre o tema acaba de ser publicado na revista de “Estudos em Avaliação Educacional”, da Fundação Carlos Chagas. Os pesquisadores Clayton do Valle Furtado e Tufi Machado Soares, da Universidade Federal de Juiz de Fora, analisaram o impacto da política no estado de Pernambuco entre os anos de 2008 e 2012. Descobriram que, no 9º ano do ensino fundamental, a implementação do bônus resultou numa melhoria de cinco pontos no desempenho dos alunos, medido por testes de português e matemática.

Esses cinco pontos podem parecer desprezíveis ao olhar de um leigo, mas são estatisticamente significativos considerando que o estudo procurou isolar outras variáveis que possam ter afetado o desempenho dos estudantes no período, para chegar o mais próximo possível do impacto causado pelo bônus naquele estado. O mesmo estudo identificou, porém, que esse ganho ocorreu apenas no momento inicial de implementação da intervenção, pois as escolas depois deixaram de melhorar por causa do bônus, o que leva os autores a deixarem uma questão em aberto na conclusão do trabalho: “Cabe aos gestores da bonificação avaliar se o retorno de no máximo 5 pontos justificaria a continuação dessa política.”

Para responder a esta pergunta, é preciso certamente considerar o custo-benefício da política comparado ao de outras intervenções, visto que ela tem impacto forte na folha salarial do magistério. A experiência internacional mostra também que é preciso estar atento a possíveis efeitos colaterais. Um deles é o estreitamento curricular. Em estudo que ainda será publicado pelos mesmos autores foi identificado, a partir da resposta de professores e alunos de Pernambuco em questionários aplicados no dia da prova, que de fato os docentes estavam passando mais exercícios e dedicando mais tempo para o treinamento para esses testes.

Como analisa Clayton Furtado, essa estratégia pode até não ser tão prejudicial se antes os alunos não estavam aprendendo nada e passaram a ter algum norte. Mas é preocupante se tiver ocorrido — fato que mereceria um estudo mais aprofundado — um estreitamento curricular, com ênfase excessiva num aprendizado para testes que tende a ser rapidamente esquecido.

Ainda há muito a entender sobre a adoção dessas políticas no Brasil, mas, mais uma vez, talvez a lição principal da pesquisa seja a de que deveríamos estar estudando com muito mais rigor a política de bônus antes de adotá-la em larga escala, como tantos estados e municípios já fazem no Brasil.

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